Ministro do STJ afasta desembargadores do RN...


Publicação: 18 de Abril de 2012 às 00:00
Isaac Lira - repórter

Prestes a completar 120 anos, no próximo dia nove de junho, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte sofreu ontem o maior abalo de sua história. Pela primeira vez, desembargadores da instituição são afastados por suspeita de terem cometido crime. Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro foram afastados de suas funções pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça, César Asfor Rocha, em virtude da investigação que apura a prática de crime na divisão de precatórios do TJ. Osvaldo e Rafael foram citados por Carla Ubarana como co-autores das fraudes nos precatórios e responsabilizados pelo Tribunal de Contas do Estado e pelo Ministério Público Estadual pelos desvios.
Ministro do STJ, César Asfor Rocha, apresenta hoje sua decisão pelo afastamento no pleno da Corte
A decisão do ministro Cesar Asfor Rocha será submetida ao plenário do STJ. Segundo texto divulgado pela Assessoria de Comunicação do órgão, o ministro levará o assunto hoje à tarde ao plenário da Corte Especial do STJ, composta pelos 15 ministros mais antigos do tribunal, para referendar a decisão. O afastamento determinado ontem é de caráter cautelar, ou seja foi uma decisão tomada para preservar a instrução do processo, para afastar o risco de eliminação de provas, coação de testemunhas ou qualquer outro tipo de influência na investigação.

O afastamento ocorre por tempo indeterminado, até decisão em contrário do próprio Superior Tribunal de Justiça. Há informação de que o ministro vá ouvir os dois desembargadores na semana que vem, no dia 24 abril, mas sem confirmação por parte do STJ.

A partir de agora dois juízes convocados devem ocupar temporariamente as funções dos desembargadores. Rafael Godeiro, que está de férias desde o dia 04 de abril, já tem o juiz Francisco de Assis Brasil, titular da Terceira Vara Criminal do Distrito Judiciário da Zona Norte da comarca de Natal, como seu substituto.

Já Osvaldo Cruz esteve de licença médica na semana passada, mas, após o fim dos cinco dias concedidos, não houve nenhuma publicação no Diário da Justiça acerca da renovação de sua licença. A Lei Orgânica da Magistratura determina que com um afastamento de mais de 30 dias, por qualquer que seja o motivo, o Tribunal precisa convocar um juiz substituto para ficar no lugar do desembargador afastado. Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro, mesmo afastados, continuam recebendo integralmente os seus salários.

O Superior Tribunal de Justiça não deu maiores detalhes sobre a fundamentação do afastamento dos dois desembargadores. Contudo, uma fonte da TRIBUNA DO NORTE, explicou que uma medida dessa natureza só pode ser tomada quando há “fortes indícios” de crime. “O STJ não tomaria uma medida tão radical se não houvesse indícios muito fortes de crime, provavelmente de peculato, que é a apropriação do dinheiro público. É possível que a decisão tenha sido tomada inclusive sem a necessidade de uma defesa prévia por parte dos acusados”, disse. O MPEenviou provas documentais obtidas na investigação.

O procedimento no STJ tem características diferentes do que está em curso no Conselho Nacional de Justiça. A ministra Eliane Calmon defendeu na última segunda-feira o afastamento de Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro. Caso o CNJ constate a prática de irregularidades por parte dos dois desembargadores, a máxima punição possível, por se tratar de um órgão administrativo, é a aposentadoria compulsória, com ganhos proporcionais ao tempo de serviço. Já no caso do STJ o inquérito judicial apura a prática de crimes. Caso fique provado que Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro cometeram crime, os dois são demitidos, perdendo o direito à aposentadoria.

A reportagem da TRIBUNA DO NORTE tentou falar com os dois acusados. Rafael Godeiro estava com o telefone desligado. Já Osvaldo Cruz rejeitou as chamadas em seu telefone celular. Os dois reiteraram em sucessivas notas durante os últimos dias serem inocentes das acusações, colocando inclusive os sigilos à disposição da Justiça.

Provas do desvio foram enviadas pelo MPE

O Superior Tribunal de Justiça não deu detalhes sobre os indícios que pesam contra Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro. As únicas informações públicas sobre provas coletadas contra os dois desembargadores foram divulgadas pelo Ministério Público Estadual na semana passada. O MPE, segundo declarou o procurador-geral de Justiça, Manoel Onofre Neto, solicitou ao CNJ o afastamento dos acusados, como também sugeriu ao STJ esse afastamento. A decisão que afastou Osvaldo e Rafael foi tomada ontem pelo ministro Cesar Asfor Rocha.

Cheques e ofícios determinando pagamentos foram as provas apresentadas pelo Ministério Público Estadual. Os cheques nominais estavam em favor de Carla Ubarana, George Leal, Glex Empreendimentos (empresa de George) e dos laranjas do esquema. Na avaliação dos promotores são as determinações de pagamento assinadas por Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro que dão mais contundência às suspeitas contra os dois ex-presidentes do TJRN.

Os documentos mostrados pelo MPE não são ofícios de fato e não têm numeração. Segundo o MPE, foram instrumentos utilizados pela presidência do TJRN para transferir valores, e supostamente para pagar precatórios, às contas das pessoas que mais tarde seriam identificadas como laranjas do esquema de fraudes. Há transferências para as contas de Carlos Eduardo Palhares e Carlos Alberto Fasanaro, em valores que oscilam entre R$ 70 mil e R$ 80 mil.

Um detalhe chama a atenção: os instrumentos oficiais de pagamentos de precatórios utilizados durante o período 2007/2011, quando se deram os desvios, eram cheques nominais e guias de pagamento. As determinações de transferências são formas “extra-oficiais”, utilizadas unicamente para pagamento aos laranjas. O promotor do Patrimônio Público, Flávio Pontes, explicou na semana passada que não existe registro de precatórios “reais”, para pessoas que realmente tinham o direito de receber o dinheiro, pagos com essas determinações judiciais. “Esse expediente foi utilizado unicamente para transferências de recursos para os laranjas”, disse. Manoel Onofre Neto disse ter incluído sugestões às peças do inquérito criminal enviadas ao STJ de medidas cautelares, como a quebra de sigilos bancário, fiscal, telefônico e etc. Trata-se do próximo passo lógico nas investigações.

Até agora foram identificados mais de R$ 13 milhões em desvios no TJRN. Carla Ubarana, ex-chefe da divisão de precatórios, operou o esquema de fraudes durante cinco anos. A expectativa da comissão do TJ que apura os desvios é que o valor fraudado chegue a R$ 20 milhões, dos quais Carla Ubarana admitiu ter ficado com cerca de R$ 6 milhões.

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